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EDUCAÇÃO E INTERAÇÃO SOCIAL: ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE O PENSAMENTO DE LEV VYGOTSKY

O psicólogo bielorrusso Lev Vygotsky (1896-1934), apesar do pouco tempo de vida (morreu com apenas 37 anos), deixou uma obra de qualidade. Vivenciou momentos políticos muito diferentes, que influenciaram os seus pensamentos, estudos e trabalhos. Nascido sob o regime czarista, Vygotsky acompanhou, como estudante e intelectual, os acontecimentos que levaram à Revolução Russa, de 1917.

Vygotsky utilizou o materialismo histórico e dialético como base para a sua teoria, atribuindo destaque às interações sociais no processo educacional. Os estudos e as concepções de Vygotsky são pautados na interação entre o homem (indivíduo) e a sociedade, assim, a formação do ser humano ocorre a partir de uma relação dialética entre o sujeito e o meio social em que vive. A interação que cada indivíduo estabelece com determinado ambiente e, especialmente com as pessoas que nele vivem, gera resultados recíprocos, portanto, o autor destaca que isso não deve estar desconexo (ou fora) do processo educacional e da relação ensino-aprendizagem.


Vygotsky compreende o indivíduo e seu desenvolvimento a partir da perspectiva sociocultural, já que o homem se constitui a partir da interação com o meio físico e social. Sua teoria é denominada de socioconstrutivismo ou sociointeracionismo. Essa relação apresenta-se como uma unidade dialética, isto é, cada pessoa internaliza (absorve) as características culturais, linguísticas etc., mas também as modificam ao longo do tempo. Isso elucida a dinâmica social e da própria realidade constantemente.


Na concepção da dialética materialista, a interação é inerente ao espaço, à matéria (ao todo) e às partes (formações materiais particulares). A interação produz consequências nos indivíduos, nos objetos e no meio ambiente, podendo ser mais ou menos intensa. Os processos históricos são decorrentes das interações sociais e da praxis humana, podendo ser ou não revolucionários dependendo das condições existentes. A interação entre duas ou mais formações materiais gera influências recíprocas em todas elas.


Segundo Cheptulin (1982), as interações possuem, em essência, um caráter transformador. O desenvolvimento – para o materialismo histórico e dialético – representa uma transformação que conduz as formações materiais a um estágio superior. A interação, que se caracteriza pela reciprocidade, é o principal “motor” da formação dos indivíduos, revela Vygotsky. Os fenômenos podem ou não entrar em interação (caráter contingente), mas ao entrarem, haverá necessariamente uma mudança (um resultado novo). A interação conduz à transformação dos corpos, assim como ao aparecimento de novos fenômenos e à passagem de um estado qualitativo a outro (desenvolvimento) (CHEPTULIN, 1982).


Tais mudanças podem ser físicas e/ou cognitivas, possuindo a relação ensino-aprendizagem e a mediação uma função importante nesse processo. Uma educação de qualidade – pautada na interação, nas adequadas condições infraestruturais, técnicas e de trabalho, na reflexão crítica, na valorização dos docentes (inclusive salarial) e dos discentes, no respeito e compromisso com o método, criar procedimentos metodológicos adequados com os objetivos a serem alcançados etc. – é imprescindível para o desenvolvimento da sociedade.


Segundo Vygotsky, os processos psicológicos complexos (denominados também de funções psicológicas superiores) – responsáveis por diferenciar os humanos dos outros animais e, em especial, dos mamíferos – apenas se constituem e se desenvolvem pelo aprendizado. Além disso, a mediação é central no pensamento do autor, pois grande parte da relação do indivíduo com o mundo externo ocorre através de instrumentos técnicos, como, por exemplo, as ferramentas e os utensílios diversos. Isso permite ao indivíduo transformar o meio ambiente de acordo com as suas necessidades.


O autor atribui relevância à função do professor como impulsionador do desenvolvimento psíquico das pessoas. Todavia, a ideia de um maior desenvolvimento não quer dizer que se deve apresentar uma grande quantidade de conteúdos apenas técnicos aos alunos, mas sim que sejam estimulados a pensar e refletir. Vygotsky afirma que a intervenção pedagógica provoca avanços que não ocorreriam espontaneamente, ou seja, um ensino de qualidade se caracteriza pelo estímulo no sentido do indivíduo atingir um nível de compreensão, habilidade e reflexão cada vez maior.


É notório que a pessoa não adquire informações e conhecimentos apenas com os docentes, assim, na perspectiva da teoria sociocultural desenvolvida por Vygotsky, a aprendizagem é uma atividade conjunta, em que relações colaborativas entre os discentes podem e devem ser valorizadas, não obstante, o professor precisa ser o organizador e mediador desse processo. Além de ser o sujeito mais experiente, precisa planejar as atividades e direcionar projetos que fomentem a interação entre as pessoas, superando a visão tradicional de sujeito ativo e passivo em sala de aula.


A partir da concepção de aprendizagem mediada, Vygotsky demonstrou a importância da mediação para fomentar o desenvolvimento dos processos mentais superiores, isto é, planejar atividades e ações, conceber consequências de uma decisão, imaginar objetos, criar perspectivas, possuir foco e definir medidas a serem adotadas, entre outros. Tais mecanismos psicológicos indicam a evolução do ser humano e são fundamentais na aquisição de conhecimentos, informações, realizar funções e atividades, organização pessoal etc.


Na teoria de Vygotsky, destacam-se também os elementos mediadores (os instrumentos e os signos), pois são relevantes na interação do indivíduo com o meio, nas relações interpessoais e na execução de atividades. Os instrumentos se referem à conexão entre o homem e o mundo, pois ampliam as possibilidades e potencialidades de transformação do espaço, por exemplo: o cerrote permite cortar mais precisamente os objetos, uma vara de pescar facilita “pegar o peixe”, um recipiente auxilia no armazenamento de água etc. Isso define a capacidade de pensar e criar objetos técnicos para facilitar a vida humana.


O signo, por sua vez, sempre representa algo especificamente, como o caso da palavra carro que remete ao objeto concreto carro. O ser humano pode imaginar sem a necessidade de ver, e essa capacidade possibilita criar imagens, pensar no caminho a ser percorrido mesmo antes de realizá-lo, não fazer ações que podem resultar em problemas, melhorar a organização pessoal e profissional no cotidiano, entre outros.


Apesar da sua grande contribuição, ainda é limitada a incorporação da teoria de Vygotsky nas escolas, faculdades e universidades brasileiras, existindo, muitas vezes, a presença de concepções conservadoras, resistências à incorporação de um pensamento crítico/reflexivo e desvalorização das relações sociais no ambiente educacional.

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